PROPINA RADIOATIVA

De ClipNews

Ex-presidente da empreiteira Camargo Corrêa disse que, para vencer licitação, consórcio se comprometeu a pagar 30 milhões de reais em subornos no ano passado

Mensalão, petrolão… No dicionário dos escândalos, são duas palavras criadas para tentar dar a devida dimensão aos últimos grandes golpes contra os cofres públicos. Eis mais um. Preso em novembro do ano passado junto com representantes de outras construtoras envolvidas em fraudes contra a Petrobras, o executivo Dalton Avancini, ex-presidente da empreiteira Camargo Corrêa, assinou um acordo de delação premiada com o Ministério Público e topou revelar coisas que até então não faziam parte da investigação. Durante três semanas, Avancini prestou quinze depoimentos aos policiais federais e procuradores. Num deles, como já se sabe, revelou que a Camargo Corrêa pagou propina para participar das obras da usina de Belo Monte, uma das jóias da coroa entre as obras de infraestrutura do setor elétrico. Era só o começo. VEJA teve acesso a outras revelações igualmente explosivas feitas por Avancini. Na principal delas, o executivo declarou que as empreiteiras escolhidas para construir a usina nuclear de Angra 3, no Rio de Janeiro, se comprometeram a distribuir 30 milhões de reais a funcionários da Eletronuclear e aos políticos que comandam a estatal.
Segundo Avancini, a licitação era de cartas marcadas. Os dois consórcios vitoriosos acertaram o pagamento de propina em troca do direcionamento do edital. O acordo foi fechado diretamente com a diretoria da Eletronuclear, subsidiária da Eletrobras, e beneficiou UTC, Andrade Gutierrez, Odebrecht Queiroz Galvão, Techint e EBE, além da própria Camargo Corrêa. As empresas se comprometeram a pagar 1% sobre o valor global do contrato, estimado em 3 bilhões de reais. O dinheiro, afirma Avancini, seria distribuído a dirigentes da Eletronuclear e a políticos do PMDB que os apadrinham. O executivo diz que não cuidou diretamente da distribuição do dinheiro e que, por isso, não sabia informar o nome dos corruptos. O método e os atores, porém, são os mesmos do petrolão.
Os empreiteiros se reuniam e combinavam entre si a cota de cada um no consórcio. De acordo com Avancini, o trambique no setor elétrico era feito pelo mesmo clube de empreiteiras que dava as cartas na Petrobras. O executivo diz que quem comandou a reunião para esquematizar o pagamento de propina aos políticos foi Ricardo Pessoa, dono da UTC, acusado de comandar o chamado “clube do bilhão” da Petrobras. Ele deu detalhes de um encontro realizado em agosto do ano passado, na sede da UTC, em que o esquema foi fechado.
Na semana passada, a presidente Dilma Rousseff disse que os crimes perpetrados contra a Petrobras são obra de “alguns indivíduos” e, mais do que isso, ficaram no passado: “Do ponto de vista da gestão, a Petrobras está inteirinha, as questões que tinham de ser saneadas o foram”. O problema para a presidente e seu governo é que os fatos são teimosos. O depoimento de Avancini mina a retórica oficial. Primeiro, porque o executivo diz que o acerto para a distribuição da propina em Angra 3 foi feito no ano passado, na reta final da licitação que definiu as construtoras responsáveis pelas obras. Segundo, porque confirma a suspeita dos investigadores de que o esquema de corrupção que funcionava na Petrobras era replicado em outras áreas do governo, entre elas o setor elétrico. Desta vez, as acusações não partem de Paulo Roberto Costa nem de Alberto Youssef, os delatores que o governo, o PT e seus satélites tentam desqualificar a todo custo — quem está falando, agora, é um executivo que até meses atrás presidia uma das maiores construtoras do país e, nessa condição, lidava diretamente com gente importante do governo.
Em outro depoimento, Dalton Avancini foi indagado sobre os pagamentos feitos pela Camargo Corrêa ao ex-ministro e mensaleiro condenado José Dirceu, outro alvo estrelado da Lava-Jato. Ele admitiu ter assinado o contrato e autorizado as transferências de dinheiro à empresa do ex-ministro, mas disse desconhecer algum serviço prestado por Dirceu à empreiteira. Para os procuradores, é mais uma evidência de que os contratos de Dirceu só serviam para simular repasses de propina. Ao todo, a Camargo Corrêa pagou 900 000 reais à consultoria do ex-ministro. Ao todo, o petista recebeu 39 milhões de reais de empresas que têm interesses junto ao governo. Mensalão, petrolão, eletrolão…

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