O alto custo da energia de Angra III

Publicado em 26 de setembro de 2011 no O Globo.

JOAQUIM FRANCISCO DE CARVALHO
e ILDO LUÍS SAUER

O custo da energia produzida em uma usina nuclear inclui a amortização do capital, o custo do combustível, os custos de administração dos rejeitos de baixa e média atividade, as despesas de descontaminação e desativação da usina ao cabo de sua vida útil e, ainda, a deposição final dos rejeitos de alta atividade. No caso de Angra III, para se calcular o verdadeiro custo de sua produção, deve-se, evidentemente, incluir o valor do investimento já realizado no projeto, o qual, referido a valores de hoje, monta a R$1,2 bilhão.
Há muito otimismo nas previsões de custos de usinas nucleares. Nos Estados Unidos, por exemplo, as usinas implantadas entre 1966 e 1986 tiveram, em média, custos 200% acima do previsto (CBO – Congressional Budget Office, 2008, “Nuclear power”s rôle in generating Electricity”, May 2nd, 2008).
E os PWRs de nova geração que a empresa francêsa Areva está construindo na Finlândia, por exemplo, já estão custando o dobro do que foi estimado antes do começo da obra (Rienstra, A., “Splitting the atom costs double in Finland – Energy, Finance and Business Finland”, Sep, 16, 2008). Assinale-se que é a mesma Areva que, em associação com a Eletronuclear, será responsável pela obra de Angra III.
O governo brasileiro destinou recursos no montante de R$10 bilhões para a conclusão da obra, sem incluir os juros durante a construção. A este valor deve ser somada a quantia de R$1,2 bilhão, correspondente ao que já foi investido na obra, sem considerar os custos financeiros.
Nos cálculos que resumimos a seguir, admitimos que Angra III será construída em 66 meses e que o BNDES financiará 70% de seu custo, a juros de 7,5% ao ano (TJLP + 1%), entrando os 30% restantes como equity (entre 8% e 12% a.a). Admitimos, também, que o custo do combustivel sera igual ao de Angra II, isto é, R$12/MWh.
Estima-se que, no Brasil, o descomissionamento de uma usina nuclear implicará futuros investimentos de, no mínimo, R$800 por kW elétrico instalado, o que, somado ao que será gasto na administraçâo dos rejeitos de baixa e média atividades e na deposição final dos rejeitos de alta atividade, poderá incidir com algo em torno de R$3/MWh na tarifa de geração, ao longo da vida útil da usina.
Efetuando os cálculos com base nestas premissas, vê-se que o investimento de capital na obra de Angra III será de R$19,5 bilhoes, resultando daí custos anuais de R$2,5 bilhões (incluindo anuidade para a recuperação do capital, seguros, manutenção, despesas com pessoal, encargos trabalhistas etc.).
Admitindo-se, com otimismo, que Angra III opere a plena capacidade durante 7.450 horas por ano e, também com otimismo, que o custo do combustível tenha uma incidência de R$12/MWh no custo final, conclui-se que a energia gerada em Angra III custará R$190/MWh. Para comparar, a energia eólica, cujo potencial de geração no Brasil é muito superior ao do urânio, foi negociada a R$100/MWh no leilão realizado em agosto passado.

JOAQUIM FRANCISCO DE CARVALHO foi diretor industrial da Nuclen (atual Eletronuclear) e é pesquisador do Instituto de Eletrotécnica e Energia (IEE) da Universidade de São Paulo. ILDO LUÍS SAUER foi diretor de Gás e Energia da Petrobras e é diretor do IEE.

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